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quinta-feira, abril 25, 2024
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A natureza manda recado

“A crise climática é tão seria que os seres humanos não imaginam que estão mudando o clima do mundo. Os dias estão mais quentes, se continuarmos assim, não vamos mais reconhecer o planeta onde vivemos”.

Al Gore, ativista ambiental

Enquanto o fogo crepita nas folhas verdes da Floresta Amazônica e nos banhados secos do Pantanal, o Ministério do Meio Ambiente passa o recado mudo de sua inação crônica. Este Governo se notabilizou pelo desmonte das estruturas institucionais de fiscalização e controle ambiental, além de, algumas vezes, participar efetivamente, por ação e omissão, das predações contra a natureza.

Enquanto o mundo civilizado se mobiliza para garantir um ambiente sustentável para as gerações futuras, o Brasil assume despudoradamente a criação de políticas cuja perversidade não tem limite. Não se trata de, apenas, desmatar, mas de invadir os espaços de populações originárias com garimpos, uma atividade que, quando feita como por aqui, traz resultados que só beneficiam meia dúzia de aventureiros. O que resta aos povos indígenas são hecatombes ambientais de quase impossível recuperação. Sem contar as ameaças e assassinatos, que se notabilizam pela crueldade e impunidade, que vitimizam as lideranças indígenas.

O que resta aos povos indígenas são hecatombes ambientais de quase impossível recuperação
Sob a desculpa de que é necessário flexibilizar (que palavra de infinitos sentidos na política) para desenvolver, o Congresso Nacional apresenta propostas cada vez mais indecentes contra a natureza. Propostas essas, originadas tanto do Executivo como do próprio Parlamento, desprovido de uma liderança minimamente ética e que possa assumir uma defesa responsável e respeitável das questões ambientais.

Observa-se um bando de apedeutas, leitores de panfletos de propaganda de esquina, a pronunciar discursos de conteúdo gasoso, com ar professoral, como se tivessem conhecimento científico para se arvorarem como pregadores de verdades absolutas. Boa parte deles, desconhecem a diferença entre o Ipê e o Manacá-da-serra, mas decantam sabedorias de orelha de livro. São esses que determinam o que se deve fazer nas terras férteis desta Pátria acorrentada na ignorância de seus governantes.

Enquanto isso, a natureza manda recados cada vez mais intensos, cada vez mais terríveis. Recados que vêm como consequências das queimadas, dos desmatamentos, das mega hidrelétricas, como Belo Monte, que com suas dezoito turbinas somente uma está funcionando. E não foi por falta de aviso durante a fase de projeto dessa usina de fio de água. Estudos técnicos demonstraram que esse rio tem uma sazonalidade bem conhecida, que só tem água suficiente em uma determinada época, depois o fluxo diminui acentuadamente. Logo, não seria ético, nem adequado do ponto de vista econômico e nem mesmo político, a sua construção. O que se pode deduzir que o motivo não foi a solução de problemas energéticos, mas, penso eu, de distribuição de vultosas quantias entre pares de algum conluio, cuja probabilidade de ter existido, é extremamente elevada.

Construíram e destruíram uma floresta, um equilíbrio milenar, deslocaram populações indígenas que não foram ouvidas em defesa de sua cultura, de seus espaços vitais. Para que? Para garantir ganhos a pequenos grupos econômicos, mas desferiram golpes cruéis e irrecuperáveis naquela região. A única contribuição claramente reconhecida foi a devastação, a perda de espécies animais e vegetais, além da mudança no regime das águas e por consequência, das chuvas.

E o recado está chegando cada vez mais intenso, mais cruel e mais devastador para todos os seres vivos, em especial para o ser humano que não faz parte do grupo de cambalacho. Estes podem pagar energia de qualquer preço, pois dinheiro fácil chega nos bolsos e nas bolsas desses iníquos senhores do podre poder.

A crise hídrica pela qual passamos é tão somente o primeiro sinal, o primeiro recado da natureza. O segundo é consequência deste; as queimadas no capim seco do Pantanal, o gado que morre do fogo que o queima vivo e até mesmo de fome e sede por falta de água nos corixos e nos banhados pantaneiros. Veja o Rio Paraguai, padece de fome e sede, porque suas águas não são suficientes para sustentá-lo, por isso, envergonhado cambaleia desviando entre os areais que afloram por toda parte. É bom lembrar que o Paraguai é a artéria aorta do Pantanal. É nela que desaguam os afluentes cada vez mais estreitos e carentes de sangue aquoso que garante a vida no universo pantaneiro.
Onde está o tal IBAMA? Queira ou não é responsável pela chama que incinera a vida natural neste planeta Pantanal. Reclama que não tem dinheiro. Então por que não grita para o mundo inteiro que o governo transforma em braseiro este solo brasileiro?

E os políticos, moralmente raquíticos, empinam o peito e declamam satisfeitos os seus eternos mal feitos transformados em virtudes nos discursos imperfeitos, pois trazem o eterno defeito de só se preocuparem com aquilo que lhes são de direito – o nababesco salário extraído do erário que é o outro nome do bolso do povo brasileiro.
E a temperatura aumenta, o calor já não se aguenta…

Por que razão será? Castigo dos céus? O seria o comunismo, único culpado no cósmico cinismo do atual governo, que culpa todo mundo e nunca olha, ao menos um segundo, para o próprio umbigo, culpado maior pelo perigo que estamos passando.

As chuvas escasseiam em muitas partes, espécies animais e vegetais desaparecem, o que é muito temerário porque quebra o equilíbrio natural, a homeostase essencial da vida no Planeta. Não somos separados de coisa alguma. Fazemos parte da própria natureza, somos apenas uma parte dela e dela não nos dissociamos, nem mesmo se quisermos. Mas não é assim que os governos nos percebem. Para eles, somos apenas eleitores que garantem suas eleições. E a natureza se revolta com razão.

Pensar em desenvolvimento nacional, implica em perceber o mundo natural como o elemento garantidor de nossa própria sobrevivência. Do contrário, nosso País ficará estagnado e isolado do resto do Planeta, porque o mundo se prepara para a sustentabilidade, enquanto o Brasil se arde em chamas e ninguém desejará nossas comodities por falta de conformidade com aquilo que o mundo inteiro preconiza e já pratica.

E a natureza manda seu recado; enchentes, tempestade de poeira, fuligens nas cidades, secas e fumaças, fomes, novas pandemias e mais outras desgraças. Até ciclones já temos por aqui, algo tão inédito. E o que fazem os mandantes? Discursam, debatem em falas delirantes, transformam certezas em mentiras escabrosas, dilapidam o erário em adendos ao próprio salário que a cada dia cria mais um penduricalho. E o povo passa fome para doar mais dinheiro para a Emenda do Relator, ou seria do roedor?
Por favor! Acordem, antes que sejam tragados pelo vendaval de poeira que a seca trouxe para nos alertar.

José Pedro Rodrigues Gonçalves é doutor em Ciências Humanas

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